Da Espanha à Polônia, a firme oposição dos agricultores da UE a um acordo com o Mercosul
As principais organizações agropecuárias de França, Alemanha, Espanha e Itália denunciam a negociação de um acordo entre a UE e o Mercosul. Mas as posições de seus governos contêm nuances e a França segue se opondo de maneira mais enfática.
O acordo permitiria aos quatro países negociadores do Mercosul (Argentina, Brasil, Paraguai e Uruguai) aumentarem suas cotas de entrada na UE de carne bovina, de aves e suínas, assim como de mel, açúcar e outros produtos.
Os sindicatos agropecuários da UE denunciam uma concorrência desleal, já que a produção desses alimentos no bloco sul-americano não está submetida aos mesmos requisitos ambientais e sociais nem às mesmas normas sanitárias em caso de controles defeituosos.
A Copa-Cogeca, que agrupa os principais sindicatos agropecuários da UE, pediu à Comissão Europeia - o órgão executivo do bloco - que "reavaliasse" o projeto de acordo e que impulsione "uma política comercial que defenda as rigorosas normas de nosso setor agrícola".
- Espanha
Na Espanha, os sindicatos expressaram sua preocupação, sobretudo em relação à pecuária.
É um acordo "antagônico com os interesses agrícolas da UE", que "anularia a maioria - senão todos - os esforços dos produtores da UE no difícil caminho para a transição climática", alerta a Associação Agrária de Jovens Agricultores (Asaja).
Até o momento não foram convocados protestos no país, mas a preocupação com esse acordo foi um fator importante nas manifestações de agricultores no início do ano.
O governo do socialista Pedro Sánchez é totalmente a favor da assinatura do acordo.
O ministro da Agricultura, Pesca e Alimentação, Luis Planas, admitiu em meados de outubro que há setores que podem se ver afetados, como o da carne bovina, mas que "pode representar uma oportunidade para setores como o azeite de oliva, o vinho e os laticínios".
É um acordo "moderno e equilibrado", com um valor "estratégico para a Espanha" e "para a UE, em um contexto de tensões no comércio internacional", acrescentou.
- França
A mobilização é particularmente forte na principal potência agrícola do continente em termos de valor.
As organizações que representam o setor convocaram uma grande mobilização nesta segunda-feira, em um contexto de crise generalizada na agricultura.
"Uma auditoria da UE acaba de revelar deficiências no Brasil nos procedimentos de controle do cumprimento das normas sanitárias", indica a Federação Nacional Bovina da França.
"Apesar disso, a Comissão Europeia prossegue com convicção as negociações que assegurarão um acesso adicional de 99.000 toneladas de carne bovina sul-americana" à UE, formada por 27 países, acrescenta.
O presidente Emmanuel Macron afirmou no domingo em Buenos Aires que a França não assinará o tratado "tal como está" negociado e que não acredita que a presidente da Comissão o assinaria sem o apoio de Paris.
- Alemanha
A Alemanha, que com Angela Merkel se mostrava reativa ao acordo por causa do desmatamento da floresta amazônica, mudou de postura com a chegada de Olaf Scholz, que busca ampliar as exportações industriais.
A dissolução atual da coalizão governamental cria expectativas de uma nova reorientação no setor agropecuário.
A Associação Alemã de Agricultores (DBV) considera "urgente renegociar" um acordo que "levaria a substituir a produção nacional por importações com padrões do século passado, em detrimento dos consumidores, dos agricultores, dos animais, do meio ambiente e do clima".
"A agricultura da UE não consegue sobreviver sem mecanismos que compensem as diferenças entre as normas internacionais e europeias", alerta o presidente da DBV, Joachim Rukwied.
Até agora, os sindicatos alemães não convocaram nenhum protesto, o que não deve impedir a reunião de manifestantes na fronteira com a França, assim como na fronteira entre Espanha e França.
- Itália
A principal organização agrícola, Coldiretti, expressou em uma mensagem à primeira-ministra, Giorgia Meloni, sua "profunda preocupação" com um acordo que teria "efeitos devastadores no setor agroalimentar.
"Acreditamos que uma estreita colaboração com outros Estados-membros da UE, como França, que compartilham nossas preocupações, pode impedir a adoção do acordo em sua forma atual", acrescentou.
O Ministério da Agricultura não respondeu ao pedido da AFP para saber qual é a posição do governo.
- Países Baixos
O principal sindicato agrícola holandês, LTO, pediu para "parar as negociações", que constituem uma ameaça para a produção avícola e láctea.
Poderia, no entanto, ser "benéfico para o setor queijeiro e uma oportunidade para a horticultura, mas se trata de somas relativamente baixas", disse à AFP o assessor de estratégia política do LTO, Klaas Johan Osinga.
Osinga diz que os quatro partidos da coalizão governamental estão divididos sobre o tema.
- Polônia
O Ministério da Agricultura expressou suas "sérias reservas" sobre um projeto que "talvez traga alguns benefícios para a indústria, o transporte marítimo e alguns serviços, em detrimento da maioria dos segmentos da produção agroalimentícia".
Uma das principais organizações agrícolas, NSZZ RI Solidarność, pediu ao chefe de Governo, Donald Tusk, "bloquear" o projeto.
- Áustria
Os parlamentares da Câmara Baixa consideraram "incompatível" uma política que "restringe a produção agrícola na Europa impondo normas cada vez mais estritas ao mesmo tempo que impulsiona acordos comerciais antigos".
A maior associação agrícola afirmou que a suspensão das tarifas para os países do Mercosul colocaria "em perigo a agricultura" do país.
- Irlanda
Os representantes dos pecuaristas (ICSA) protestaram na Câmara Baixa do Parlamento, a poucos dias das eleições legislativas do fim do mês.
(C.Fontaine--LPdF)