Morre aos 96 anos o cantor e ativista Harry Belafonte
Harry Belafonte, o astro que introduziu os ritmos caribenhos na música americana e que era um defensor dos direitos dos negros, morreu nesta terça-feira (25) em Manhattan, de insuficiência cardíaca, aos 96 anos, informou seu representante.
Nascido em 1° de março de 1927, no Harlem, filho de mãe jamaicana e pai francês da Martinica, o ator e intérprete de calipso - cujo nome completo era Harold George Bellanfanti - passou a maior parte de sua infância na Jamaica antes de retornar a Nova York, um caldeirão cultural que influenciou sua música e sua luta pela igualdade racial.
O calipso de Belafonte, um gênero de música caribenha que bebia das influências da África Ocidental e da França, o levou à fama durante a prosperidade e crescimento das cidades após a Segunda Guerra Mundial.
Seu terceiro álbum, "Calypso"(1956), foi o primeiro LP a vender mais de um milhão de cópias nos Estados Unidos.
O álbum incluía a música que virou a canção emblemática de Belafonte, "Day-O (The Banana Boat Song)". Para os críticos essa música era simplesmente dançante para que as pessoas se sentissem bem, já para Belafonte era o incitamento à rebelião dos trabalhadores que exigiam salários justos.
Belafonte "utilizava sua plataforma quase de forma subversiva porque podia introduzir mensagens, mensagens revolucionárias", disse o cantor John Legend nesta terça-feira em um evento da revista Time.
"Quando as pessoas pensavam que simplesmente cantava sobre os bons tempos na ilha, ele estava enviando mensagens de protesto e revolução em tudo o que fazia", acrescentou.
Nem mesmo no início da carreira, Belafonte fugiu das polêmicas. Em 1957, ele protagonizou o filme "Ilha nos Trópicos", no qual interpretou um político em uma ilha fictícia envolvido em um relacionamento inter-racial.
Ele se tornou, em 1954, o primeiro afro-americano a ganhar um prêmio Tony por seu papel no musical da Broadway "Almanaque do John Murray Anderson".
Seis anos depois, repetiu o feito ao ganhar um prêmio Emmy por "Tonight with Belafonte", seu programa de música na televisão. Belafonte também ganhou três Grammys.
- Luta -
As reações à perda do cantor e ativista vieram tanto da indústria musical quanto do cenário político.
O presidente americano, Joe Biden, saudou a memória de "um americano revolucionário, que usou seu talento e sua notoriedade e voz para redimir a alma da nossa nação".
O secretário-geral das Nações Unidas, António Guterres, através de seu porta-voz, Stéphane Dujarric, destacou "sua generosidade inabalável e sem limites" em uma vida "dedicada à luta pelos direitos humanos e contra a injustiça em todas as suas formas".
Embaixador da Boa Vontade da Unicef por 36 anos, o legado de Belafonte inclui “a defesa dos cuidados de saúde primários, do tratamento do HIV/aids e do acesso gratuito à educação para todos”, disse a diretora da organização, Catherine Russell.
À medida que o movimento pelos direitos civis ganhava força, Belafonte assumiu um papel pioneiro que foi além do simples apoio moral - tornou-se um confidente de Martin Luther King e contribuiu com seu próprio dinheiro para apoiar a causa.
"Quando as pessoas pensam em ativismo, sempre pensam que há algum sacrifício envolvido, mas sempre considerei isso um privilégio e uma oportunidade", disse ele em um discurso de 2004 na Universidade Emory.
Belafonte convidou Luther King e o pastor de Birmingham, Alabama, Fred Shuttlesworth, ao seu apartamento em Nova York para planejar a campanha de 1963, a fim de integrar esta cidade notoriamente racista do sul.
Quando King foi preso em Birmingham, Belafonte levantou U$ 50.000 - cerca de U$ 400.000 em valor atual, ou aproximadamente R$ 2 milhões - para salvá-lo, numa época em que a ascensão da música pop trouxe riqueza e estilos de vida luxuosos para muitos artistas.
"A popularidade mundial e o compromisso de Belafonte com nossa causa é um ingrediente-chave na luta global pela liberdade e uma poderosa arma tática no movimento dos direitos civis aqui nos Estados Unidos", disse King sobre o músico.
O ativista passou muito tempo na África - especialmente no Quênia - e se tornou um dos artistas americanos mais importantes na luta contra o apartheid na África do Sul.
Seu álbum, "Paradise in Gazankulu", lançado em 1988, falava da opressão dos negros sul-africanos e foi parcialmente gravado em Joanesburgo com artistas locais.
Belafonte também começou o supergrupo USA for Africa, cuja música "We Are The World" arrecadou US$ 1,985 bilhão (cerca de R$ 10,02 bilhões em valores atuais) para as vítimas da fome na Etiópia.
(V.Blanchet--LPdF)