Evacuados de Gaza voltam ao norte: 'Onde quer que formos, morreremos'
Rahma Saqalah havia fugido, com o marido e seus quatro filhos, dos bombardeios israelenses na cidade de Gaza. Ela decidiu voltar, nesta quinta-feira (26), com sua filha mais nova, as únicas sobreviventes do impacto de um míssil no abrigo onde acreditavam estar seguras.
"Onde quer que formos, morreremos", afirma a mulher de 40 anos, antes de partir da região de Jan Yunés, no sul da Faixa de Gaza, em direção à capital do enclave palestino.
Saqalah faz parte dos 600.000 palestinos que se retiraram do norte da Faixa, de acordo com a ONU, depois que Israel, a partir de aviões, em 13 de outubro, jogou folhetos que orientavam a saída "por sua própria segurança".
Os bombardeios israelenses, iniciados em 7 de outubro em retaliação a um ataque sangrento do movimento islâmico Hamas, se concentraram inicialmente na cidade de Gaza - embora nenhuma área deste território de 362 km² e 2,4 milhões de habitantes esteja a salvo de incursões.
No entanto, segundo a ONU, cerca de 30.000 deslocados retornaram ao norte nos últimos dias, "devido aos bombardeios incessantes no sul e às dificuldades para encontrar um abrigo adequado".
"Meu marido, Fadel Saqallah, e três dos meus filhos, Daoud, Mohammad e Majed, foram martirizados na terça-feira ao amanhecer", afirmou Rahma Saqallah na quarta-feira.
Ela partiu, depois, para Jan Yunés, e em seguida, na quinta-feira, confirmou por telefone que havia voltado à cidade de Gaza.
- "Morrer em nossas casas" -
Seu marido tinha 47 anos. Majed, o filho mais novo, tinha 9 anos. Já Daoud, o mais velho, 18. E Mohammad "deveria comemorar seu 15º aniversário" na quarta-feira, disse.
O ataque "destruiu o segundo e terceiro andar" de um prédio onde várias famílias, total de sessenta pessoas, se refugiavam.
O bombardeio, segundo ela, matou onze membros da família Saqallah, entre eles seu marido e três filhos, "e 26 pessoas de outras famílias".
"Da minha família, apenas minha filha Raghad, de 17 anos, e eu sobrevivemos. Estamos vivas, mas não posso dizer que estamos bem", admitiu. "Eles reduziram Gaza a ruínas, querem transformá-la em um cemitério".
O primeiro-ministro israelense Benjamin "Netanyahu é um mentiroso. Eles nos instigaram a ir para o sul e nos mataram", acrescentou.
Mais de 7.000 pessoas morreram em Gaza, muitas delas crianças, de acordo com o movimento islamita palestino.
Depois de se refugiarem em um hospital em Deir el-Balah, mais ao sul, Abdallah Ayyad, sua esposa e suas cinco filhas se amontoaram na carreta de um veículo de três rodas e seguiram ao norte, para retornar à cidade de Gaza.
"Estamos voltando para morrer em nossas casas. Será mais digno", disse o pai, em um tom de repugnância e resignação.
"Aqui vivemos em condições humilhantes. Não há nada para comer, nada para beber, não há banheiros e, para piorar, há bombardeios por toda parte", lamentou.
- "Nenhum lugar é seguro" -
Alguns abandonaram o sul. No entanto, incapazes de chegar às suas casas no norte devido aos intensos bombardeios, decidiram buscar refúgio no Al-Chifa, o principal hospital da Cidade de Gaza.
Famílias inteiras se aglomeram sob tendas penduradas entre as paredes e colunas de concreto, como se fossem barracas.
"Minha esposa, meus filhos, meus cunhados, cerca de 40 pessoas no total, se revezam para dormir em uma tenda de apenas três metros quadrados. É indigno até para o gado", afirma Mohammad Abou al-Nahel, um dos deslocados.
"Mal conseguimos usar os banheiros devido à superlotação. Continuamos vendo mártires e feridos chegando. Não temos água potável para beber, e as crianças estão doentes devido ao frio", relata Mennah al-Bahtiti, outro deslocado que deixou o sul em busca de abrigo no hospital.
A coordenadora de assuntos humanitários da ONU para os territórios palestinos, Lynn Hastings, alertou na quinta-feira que "nenhum lugar é seguro em Gaza" devido aos bombardeios israelenses.
Em relação aos bombardeios no sul, depois que Israel alertou os civis a deixarem o norte por questões de segurança, garantiu à AFP que o exército israelense não reagiu imediatamente.
A guerra entre Israel e o Hamas resultou em 1.400 mortes do lado israelense, em sua maioria civis, de acordo com as autoridades israelenses, apenas em 7 de outubro, dia do ataque lançado pelo grupo islâmico.
(N.Lambert--LPdF)